domingo, 3 de maio de 2009

Sobre o Projecto "TORGA EM SMS"

Já há quem [Phil Marso] pretenda transformar a linguagem SMS em género literário. Nós não queremos. Mas lançámos o desafio. Um Diário de Miguel Torga integralmente “traduzido” em SMS. Escolhemos o “Diário XII”.

Micaela Andreia Neves e Márcia Arzileiro, ao tempo alunas da Licenciatura em Ciências da Informação do Instituto Superior Miguel Torga, aceitaram o repto. A conclusão do curso ia colocando o projecto em risco, algumas dezenas de páginas por “traduzir”. Mariana Alves e Laura Sobral (14 anos, estudantes do 8.º ano), esseémeésizaram as páginas em falta.

Neste mesmo espaço pode o leitor confrontar algumas das páginas convertidas em SMS com o texto original. Que a experiência gere discussão, promova o debate em torno da língua portuguesa, é o nosso desejo.

sábado, 2 de maio de 2009

PROJECTO COMPOSTO POR QUATRO BLOGS

Ao blog continente da versão integral do “Diário XII” em “linguagem SMS”, juntam-se outros três. Em http://torgaemsms.blogspot.com disponibilizam-se dezenas de notícias sobre o tema, do mixuguês à taquigrafia, dos etnolets às palavras em vias de extinção.
Este blog agrega ainda mais de uma dezena de vídeos reportando o tema. Isto para além da divulgação de sítios cuja consulta se recomenda, do incontornável Ciberdúvidas da Língua Portuguesa (http://ciberduvidas.sapo.pt/) aos programas “Cuidado com a Língua! (RTP), e “Páginas de Português” (Antena 2).

Outros 38 vídeos surgem publicados no blog “Diário XII”, agregando-se aqui praticamente todos os vídeos sobre o escritor disponíveis na web, em páginas diversas. 20 desses vídeos reportam à iniciativa “Café Entre Torgas”, coordenada por Sansão Coelho numa parceria entre o Instituto Superior Miguel Torga e a Câmara Municipal de Miranda do Corvo. Entre os vários testemunhos divulgados nesses vídeos, realce para a comunicação do Padre Dr. Valentim Marques, editor de grande parte da obra de Miguel Torga e seu amigo pessoal. Valentim Marques acompanhou Miguel Torga na viagem a Angola e Moçambique, périplo que o poeta detalha no “Diário XII” (18 de Maio a 12 de Junho de 1973).

BLOG “SÍTIOS” GEOREFERENCIA O ITINERÁRIO DO ESCRITOR

Por seu turno, o blog “Sítios” (http://mapastorga.blogspot.com/) georeferencia o itinerário do escritor na edição XII do seu “Diário”. São ao todo 62 mapas e fotos, publicação com recurso ao “Google Maps”.

COMENTÁRIOS DE ESPECIALISTAS

Por último, referência para o blog “TORGA EM SMS – OPINIÕES QUE CONTAM” (http://torgaemsms2.blogspot.com/). A coordenação do projecto solicitou a vários especialistas opinião sobre a iniciativa, pedindo-lhes também que se pronunciem sobre os desafios que se colocam à Língua Portuguesa, tendo por base a generalização da "linguagem SMS" entre os jovens.
Os contributos recebidos serão publicados neste blog.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Cbr, 17 d Maio d 1973

VIAGM

É o vnto k m lva.
O vnto lusitano.
É st sopro humano
Univrsal
K nfurna a inkietaçao d Portugal.
É sta fúria d loucura msnsa
K td alcança
Sm alcançar.
K vai d céu em céu,
D mar em mar,
Ate nc chgar.
É sta tntaçao d m ncontrar
+ rico d amargura
Nas pausas da avntura
D m procurar…
[p 9] [MAN]

Luanda, 18 d Maio d 1973

Rvolvo-m insofrido na cama scaldant, a rgistar, inda atordoado, as 1as imprssoes d 1 cometido a k eu próprio n consigo ncontrar clara motivação. Nascido d 1 impulso irrflctido, nl s conjugam crtamnt forças + podrosas do k as da minha consciência. O poeta é o mandatário d mtas vontads ocultas, o vctor d variados tropismos insuspeitados. O sntimnto obscuro d k n podia sr protelado p + tmpo 1 ncontro há largos anos aptcido e a crpucular prmonicao d 1 adeus etrno tlcz n sjam dscabidos na crónica dsta avntura k d tão long m touxe e tantas rsistncias m obrigou a vncr. Fisiológicas ate. Ms vnci-as, e aki tou ao cabo d 8 horas d pavor e dslumbramnto k tivram fim n1a spcie d bak da alma. Angola! N foi crtamnt a msma emoçai k sntiu 1 mareant d kinhntos ai pisar stas paragns, ms kuase. Dntro d mim rssoavam mil alvoroços, a par d cavos sussurros mnos solsrs. Apnas o avião dscolou, 1a bisarma k parcia 1 comboio aéreo, dp d dar voltas na cadeira cm os cães na palha do ninho frsco, tntei lr, ouvir musica, vr cinma e, finalmnt, imitar os rstants passageiros e dormir. Kual o k!
N s distrai facilmnt o spirito m+nhado n1 dscobrta tão mdularmnt ncssitada, e mt mnos o instinto d convrsaçao vigilant. N1a angustia progrssiva, rsolvi ntao, a prtxto d m documntar - os ardis a k rcorr a razão impotnt! -, arranjar maneira d subir à cabin d comando. Ali, ao mnos, tria confortavl ilusão d participar na lucidz do voo. E la consgui pntrar no santuário, 1 cochicho no focinho do aparelho, forrado de computadors, ond 3 automatos obsrvavam agulhas, intrprtavam sinais, intrplavam em código ouvints distants. Mti convrsa, fiz prguntas e considraçoes, citei Saint-Exupery, mal lmbrado d k stava a tratar c heróis s outra era, k viam o mundo d 10 mil mtros d altura, dsapaixonadamnt, neutramnt, sp a cumprir instruções e raramnt a tomar dcisoes. D tal maneira dsumanizados k acabei p m skcr tb da minha própria humanidd. Sm dar p isso, fui prdndo a nocao do risco k constantmnt nos ameaçava – a fluidez do spirito a sobrpor-se a força da gravidd -, e acabei p vogar sm rticncias trrnas e mdidas tmporais n1 ceu d strlas k lmbrava 1 pomar azul c frutos doirados kuase ao alcance da mão. «nst momnto sobrvoamos as Canárias…>. . .
Parcia 1a ficção. Qd o monstro mcanino, n1a lvza d pna, tocou o rctangulo ngro k traços d luz balizavam, ate m nvrgonhei do romantismo prtrito do meu trror. Sai ntao dakel spaço rsrvado e condicionado, ond nm m do natural era lgitimo, e rspirei o ar livr das contingncias. 1 ar knt, húmido, psado, pgajoso, k s m colou instantaneamnt ao corpo cm um grud invisivl e m troux a pl a lmbrança skcida do Brasil. O bafo scaldant d 1a trra ond sei k tou, d k já vi sinais concrtos, e k so atrvs dsta rspiraçao morna e pastosa m parc real.
[p 10-12] [MAN]

Luanda, 19 d Maio d 1973

scrvo diant da msma paisagm feia pr k abri os olhos d manhãzinha e k parc abafar cm eu. Paisagm sca, pulvrugnta, ardida, d vgtaçao prcaria e rasteira, k algumas cabras famlicas dpnam e algumas prsnças arbóreas tntam em vão ergr: embondeiros disforms, edmaciados, monstruosos; mangueiras sombrias, spssas, maciças; mamoeiros sgrouviados, sintticos, d tsticulos ao pscoço. N1a aplicação sforçada, tnto comprndr st xao em si msm, spcificamnt ms os sntidos rfilam, insguros fora dos seus padrões habituais – transmontanos, alntjanos ou beirões. E, p + k n keira, sinto-m nl intruso, rjeitado, xcluido, c a imprssao incomoda d k, s morrss aki, sria + facilmnt comido p 2 abutrs k m spreitam da ponta d 1 galho sco do k pla trra da spultura.

Em mangas d camisa, fui há pc visitar a cidd. E o largo passeio pla urb aprssada, nfatica, lviana, aprtada n1m cinturão d mucqs, agoirnto anl d Saturno, n m dsanuviou a alma. Plo contrario. Qd rgrssei a casa, trazia 2 mtropols nos olhos doridos: 1a, arrogant, rtorica, d papelão, a ngar o prto; outra, calada, tntacular, eczmatosa, a ngar o branco. 1a k parc 1 dlirio fbril d sitiados; outra 1 acampamnto sorna d sitiants.
[p 12-13] [MAN]

Luanda, 20 d Maio de 1973

A alma do ngro sra realmnt 1 enigma, cm m garantiu hoj 1 padr comilão n1 almoço d baptizado, ou sra romba a comprnsao do branco? Nkuanto a família k m albrga e 1a catrva d convidados s dirigia à igrja, a mtr a cabça d 2 neofitos na pia d agua bnta, fikei d plantão *a casa e aos acpips na companhia d 2 nativas, 1a adulta, k vinha ajudar na cozinha, e outra adolscnt, k tomava conta da filha + nva dos patrões. Às tantas, a pkrruxa, n1 caprixo, pgou n1a rgua e agrdiu a guardiã, k, naturalmnt, a dsarmou.

- Prtas! Prtas! – gritou a fdlha em fúria.
-bm sei k sou prta… - murmurou a + idosa.


“Bem sei k sou prta” é exactamnt o oposto d “Bm sei k sou branca”. E há kinhntos anos k as 2 etnias s xcluem mutuamnt nos trmos stritos dst dilma bárbaro.
[p 13-14] [MAN]

Cela, 21 d Maio d 1973

+ trzntos kilomtros s dsilusao paidagistica e humana. O mbondeiro é, na vrdd, o aborto da flora, a vrgonha do reino vgtal. Cm smlhant trambolho atravancado nos olhos n há blza panorâmica possivl. So km o tivr totmicamnt tatuado na alma, msm cm maldição, o pod amar. E o pior é k,qd ele falta, o kuadro angolano fica vazio. Olho a roda. E a grandza natural k m nvolv – spraiada, prguiçosa, c 1 mont akm e outro alm a bocjar sm pdir licnça . parc saudosa dakla elfantiase arbórea.
Qt à dsilusao humana, o mbondeiro k a motiva é outro. Tm prnas e braços, naturalmnt. N há duvida; o portugs foi incapaz d rptir nstas paragns africanas o milagr brasileiro. Lá, nraizou-s; aki, n. crtamnt pk la o sr e o scravo eram ambos emigrados e colonizados. Strangeiros os 2, tinham a msma ncssidd d sobrvivncia e d ntndimnto. E rconstruiram juntos na trra alheia, c o msm suor, n1a simbios original, as pátrias nativas, ate no paladar. Aki, o branco continua a sr intruso. N comunhão de corpos e almas. Visito 1ª roça modlar. E dsnimo. 1 abismo intransponivl, spacial e tmporal, spara a casa grand da sanzala. O indigna n faz part da família. Ficou long dos afectos, dos sntimntos, da fratrnidd e, ate, da snsualidd. Do amor, n1 palavra. Isolado na sua aldeia, sgrgado, á 1ª makina útil k no fim do trabalho rcolh à arrcadação.
[p 14-15] [MAN]

Sto antónio do Zaire, 22 d Maio d 1973

ptroleo! Scrvo a palavra, creio k pla 1ª vz, e kuase k m admiro d a n vr alastrar no papl n1a grand nódoa ngra e gordurosa. Há conotações axim. Apsar d abrto e lv, o som tm no meu spirito um eco dnso e psado. Contmporaneo do advnto triunfal na cna do mundo dss pus untuoso e ftido, xtraido d abcssos rconditos da trra, nc consgui acomoda-lo harmoniosamnt nos sntidos e no ntndimnto. Sei k, onde l aflora, nasc o oiro. Ms nm axim o amo. Ao vr do céu, há pouco, o 1º poço a ardr, prguntei a mim msm dntro do avião, apsar d o sbr alimntado a gasolina, s akela xamã sria 1 lum d sprança ou 1 sinal d maldição. E pc dp, junto d 1ª torr d prfuraçao, nkuanto rcbia xplicaçoes dos ntndidos e pisava a maxa btuminosa k saia das profundidads, ia pnsando na lição k ali stavamos a dar ao indigna. Em x d mprstarmos consciência racional à sua rikza anímica, d lh abrirmos o ntndimnto pr as virtualidds d anaturza k m ama ms dsproveita, nsinamos-lh a tcnica d a dstruir, d a violntar, d a svntrar e d a polujir finalmnt c as fzs da sua própria alma keimada.
[p 15-16] [MAN]

Sto antónio d Zaire, 23 d Maio d 1973

a obstinação d visitar o sitio k o meu comprovinciano Diogo Cão pisou pla 1a vz ia-m custando a vida. A raiva do Zaire parcia krr vingar-se em mim da violação d kinhntos. Dp d deambular plas suas muilas – 1a xtnsa Vnza slvagm d grands canais sonolntos e rflctir 1a anfíbia arkitctura vgtal -, ntrei confiado nakela torrncial magnitud. E foi a profanação. O vnto soprou, as ondas rgram-s, a alma fluvial bramiu, e dai a nd a casca d noz em k eu navgava, a dançar na crista da fúria, transformou-se na morada em k o precário motor do caíque era o único deus a que a fe se apegava. Mas, inflizmnt, td acabiu em bm, apnas no dsconforto d 1a molha da cabça aos ps e na emoção gatafunhada d 1 poema.
[p 16-17] [MAN]

Sto antónio do Zaire, 23 d Maio d 1973

DIOGO CAO

A pura gloria tm
A humild singlza do teu nom.
E crsc etrnamnt,
Cm 1 caul imortal,
No fust do padrão
K a tua inkietaçao
Rgueu
Nsts confins do mundo ond xgou.
Limpo brasão d km so dscobriu
E nd conkistou.

[p 18] [MAN]

Lobito, 24 d Maio d 1973

4 instantaneos: a aridz dos monts circundants, Camões ntronizado n1 pdstalm o fort d catumbla e o empório comrcial da Casskel. A trra, outrora cobrta d vgtaçao, strilizada pla incomptncia sanitária k incndiou o mato pr dblar a doença so sono; o épico a nfurnar o peito heróico diante do analfabetismo indígena; a força de ocupação fortificada e clbrada; e a xploraçao colonial c as ltras tdas. 4 imgns avulsas da noxa boa consciência civilizadora.
[p 19] [MAN]

VERSÃO ORIGINAL

Quatro instantâneos: a aridez dos montes circundantes, Camões entronizado num pedestal, o forte de Catumbela e o empório comercial da Cassequel. A terra, outrora coberta de vegetação, esterilizada pela incompetência sanitária que incendiou o mato para debelar a doença do sono; o épico a enfunar o peito heróico diante do analfabetismo indígena; a força de ocupação fortificada e celebrada; e a exploração colonial com as letras todas. Quatro imagens avulsas da nossa boa consciência civilizadora.

Moçamds, 25 d Maio d 1973

o dsrto abordado. A trra a transformar-s progrssivamnt em ngativo. O reino minral dgradado, e o vgtal e o animal inda a teimarm, a rduzirm as exigncias, spalmados na folha coriácea, aguçados num pico, ndurcidos n1 casco.spctros d erosão, monstruosidads fisiológicas, miragns alucinants. Rochas k parcm fantasmas, plantas k parcm bixos, bixos k parcm plantas, carcaças, rastros, silncio. 1 silncio d horizonts abrtos, infinito, ond o sofrimnto s cala, a agrssividd s oculta, a voz n tm eco. Meia dúzia d horas d dslumramnto consntido e trror rcalcado, o instinto a sntir-se em pânico diant d 1a realidd k contactada pla 1a x, sm rflxos pr smlhant imnsidao, pr smlhant strilidd, pr smlhant absurdo, e a razão humilhada p lh n podr acudir c nnhuma das mzinhas habituais. P n sr capaz d instituir 1 lei, 1 rgra, sm dias, sm staçoes, sp dsmdido, sm horas, sm dias, sm staçoes, sp igual no spaço e no tmpo, imagm física da etrnidd morta.
[p 19-20] [MAN]

Moçamds, 26 d Maio d 1973

O dsrto inda, ms agora palmilhado, rodado, sobrvoado. Areia, areia, areia, e milagrs geomtricos do vnto, milagrs pictóricos da luz, milagrs musicais do silncio. 1 mundo sco, stril, assptico, skcido dos homns k o smeavam, das raízes k o sugavam, da agua k o rfrscava. 1 mundo ond nenhum poema d sprança tria sntido e nnhum poema d dsprança pod sr ouvido. A magstad da vlha deusa Trra n1a altivz olímpica, sm um rskicio d amor matrnal a trai-la n1a lágrima, n1 sorriso, n1 gsto. A indifrnça surda e muda, apnas ondulada aki e alm n1a spcie d fminilidd prvrsa.
[p 20] [MAN]

Sá d Bandeira, 27 Maio 1973

Dps d aéreo dslumbrament d maciço d Chela e d abissal fascínio d Tudavala, a rasa emção d cmitério d missão católica d Huíla. Aqui jaz... Aqui jaz… Aqui jaz… E são noms d tds as nacionlidds, ptgueses, belgs, frnceses, almães, inscrits lad a lad em humilds lousas =’s, seguids d 1 inscrição trágica: falcido c/ 24 ans, c/ 45, c/51, c/32…Noms d homens q vinham ao encontr d mort certa e prematura pr conta d Deus e do semlhant. Pr conta d fé, d esperança e d caridade. Há outrs eppeias a admirar tb n planlto. A ds colons mdeirnses, pr ex., q desmbarcarm ns areias d Moçâmedes, subiram a serra em carrs d bois, desbrvaram, semearam e sucumbirm, e d q restm apens os descndnts pobrs, os chicoronhs, resídus humans s/ ombrs sequer p suprtar o mit ds pais. Ms o q s fz impelid plas necessidds d corp há-d ficar smp aquém d q s faz obrigd pla exigências d alma. Mt embora a trnscendência s possa atingir d várias maneiras, a dádiva abnegda d vd é d long a + absolut. Quas apostv q aql camp sant será no futro d pátria angolana 1 panteão nacionl. Ou a rssureição d Crist e a fraternidd human deixarão d ter sntd nsts parags.
[p 21-22] [MA]

Sá d Bandeira, 28 Maio 1973

Mnments. O irgulh branco n pd dxar d’os erguer pr td a part, os poetas d coroa d lours e lira n mão, os guerreirs d’espad à cinta ou em rist, os gvrnantes petrifikds num gest. E ei-ls sobrbs ns pedstais, épks, heroiks ou solens, r-lanceads d soslaio pr olhs mrnos, analfbts e humilhds, q nls fixam apens as pregs d gargntilh, a catana agressiv ou a mão imperiosa. Cantores, conquistdrs, admnstrdrs. Bronzs d’eternidd vã, destinds + ced ou + tard a 1 encarnção. Paro a comtmplá-ls, e n consg evitr q a imgnção os n derreta e os mold num futro prox. pr cont doutrs glórias. Pr conta ds mts Gungunhanhas q esperam tb a sua consagração.
[p 22] [MA]

Sá d Bandeira, 29 Maio 1973

Vsita a um sábio missionário estrangeiro q há dékds aq s radicou e dá largs ao espírit a est luz afrikn. Enquant discorria sobr a matéria em q é mestr, exibia livrs e recensões, ia-o obsrvand. Espécie d Bernard Show d etnografia, nas barbs e n srksm,cheio d si, conscient d q vale, havia ns suas palavrs n sei q dstncia e q desdém. E doeu-m aqla arrogncia, q a nssa pbrez cultural lgtmva. A conts há tnts ans c tnts raçs d planeta, e n conhecems dls o + essencial. Os seus enigms e mistérios pouco ou nd ns preocupam. O esforço inicial d’alguns pioneiros n foi contnuad. N tems 1 ciencia islamik, judiak ou negr ns eskls, centrs d estd ond s apure um futuro ecuménico. São os frnceses, os inglses e os almaes q sabm d Maomé, d sionismo, d ngritud. E vim p casa humilhd eskrevr est pag. km quem, dps d apnhr 1 mercid boftd numa ds facs,pr sua prpria mão esbofteasse a outr.
[p 22-23] [MA]

Nv Lisboa, 30 Maio 1973

O pe eskrv as unidds; o autmvl adit as parcels; o aviao mostr a soma. Ds 3 maneirs m tnh servd p lvr dst terra 1 img cndigna. D terra, rept. A ds homns n rqreu tnt esforç. = pr td a part, ao 1º relanc fika entendd. 2 lads d 1 medalha: n vers, a fisionomia ávid e leviana d brank, q n consguiu trdzir 5 sec’s d presenç numa missão hisrotk; n rvrso, a d negr, humlhd n sua inocência tribl ou dgrdad n sua destriblizçao. Os muceqs d Luanda são bairrs d lata d Lisboa. Em ambs s processa a mesm dissolçao humna.
Teimo, pois, n prspecçao d naturz, o unik mistério q rest em Angola. Ms c pouk sucesso, reknhç, msm dps d akrdr n memoria adrmcida a experiência brasileira. As terras d St. Cruz, pr ond andei n mennice, n parciam estar smp a arder. Havia fonts, rios e ribeirs pr td a part, e viam-s impressões dgtais a kd passo. E eu sou1 homem d impressões dgtais, ds mãos e ds pés. O sulk d arad é tão impressiv p mim km o traç d canet. Leio tnt numa lavrd alentjn km num livr. E q posso eu ler nsts extnsoes incults, selvagns, ind n purez orignal ds 1ºs dias d criação. Apens as potncialidds genesíacas d uma grnd terra d promissao. A antcipçao imgnd d 1 pais imens segrgd pls seus naturais. Camps arads, aldeias, vilas e cdds c noms d génese naturl, emergnts d realidd e n d tabulet, colads a ela, km os d’agr. Nv Lisboa, pq? Carmona, a q propsito?S, 1 próspero pais futr, construid c amor e suor do Zaire ao Cunene, kd hbtnt pr cnta própria e n pr cont alheia. 1 país a kmnhr unitariamnt,e n uma colónia salteadamnt a tropçar.
[p 23-25] [MA]

Luanda, 31 Maio 1973

É pena. Flhms pr 1 trz. Bstv q td quanta q fzms fosse pr outr intenção. Q kd 1 ds q vieram mar fora trouxesse a convikçao d q ser anglno, mçambkn, guinéu ou tmrense eram maneirs heteronims d ser prtgs. Ms nnhuma escola d pátria lh encinou a sério, nem algums exemplridds paradgmatiks foram suf’s p lh incluir.
[p 25] [MA]

A voar p Moçmbk, 1 Junh 1973

Tnh d m rendr a evdncia: o homem q voa dimension o mnd d’outra maneir. Q prspktv podria eu lvr d imensidão afrikn, a calcorreá-la a pass d karangj? A vd inteir n chgria p trçr nl ½ dúzia d coordnds. Assim, d 1 so relanc, abranj a infnt grndz dst corp febril e snlento, ao msm tmp despid e inviolad. Corpo ond alts serrs e cordlheirs infndveis são rigs insgnfknts, e rios intermnaveis e caudalosos parecem veias exangs. Até o absurd d eu o espreitr d mil m. d’altura, comodmnt instld numa kdeira e a rspirar ar condiciond, torn + signfktv a mnh obsrvçao. Vo comparand 2 realidds: aql a q pertnç, j quas angelik d tão abstrat, e a q leved la em baix, ao res-d-xao, konkret, terrosa, ind a lavrar. A dist. Q vai d Lusaka, q nst precis mmnt esprit pl postg, á Flornç q m akd ao bk da pena! Q esforç trá d fzr o nergr p chgr ao palácio d Snhria e q desnudamnt é ncssário a 1 europeu p regressar, msm em imgnçao, a primitv decência d 1 cubata!
[p 25-26] [MA]

Beira, 2 Junh 1973

Pareç um profet s barbs, a vaticinr desgraçs ns carts q eskrv, ns nots q rascunh, ns conversas q vou tendo. Mas q hei-d eu fzr, s dsd q pus o pé em Àfrica viv em panik, sint a terra fugir-m dbaix dos pés? Em Angola, há dias, num fzenda, eu a cuidr q pousv num casa d paz, e tnh por cima d sala, ond estv a ser obsquiad, um falso d ciment trnsformd em paiol belik, c mtrlhdora e td. Aq, os meus interluktors, =ment gentis, sentds às mesas recheads d marisk, rebatem as mnhs apreensões c/ carabins e balas.E perk a esperanç. N vnh n ilusão d enkntrar generlizd nsts paragns 1 espirit d missão. Ms tb n cntv q ele stivss tão ausent ds consciências, q a angustia q m oprime foss + pl q falt d q pl q exist. + pl q flt d 1 gneroso prject colectiv d q pl q existe ao abrig d’um jg d egoisms msquinhs mal artiklds. Os massakrs q desenkdearam est guerra, em x d terem sid ocasião d auto-kritk, trnsformaram-se p a maioria dos klons em mtv suplmntar d repressão.E n prkaria barkaça d 1 oportunism grosseir q tds nvgam. E n há port d salvament p aquels q asfixiam n boa consciência do present os remorsos do fturo.
[p 26-27] [MA]